(Uma entrevista com o Dr. Mario Roso de Luna)
A entrevista do Dr. Mario Roso de Luna, concedida a “El Liberal”, de Madrid, está de acordo com a nossa maneira de ver, segundo o artigo que publicamos nesta revista, no número de Abril de 1926, intitulado: “A questão importante da vinda do Instrutor”.

Chegamos ontem ao alegre terraço-observatório do conhecido homem de ciência e teósofo, perguntando-lhe à queima-roupa:
– Conheceis, mestre, o novo Messias?
– Não. Trata-se simplesmente de um estimável jovem, de quem, para julgar, ter-se-hão que esperar os frutos. Em anos anteriores, parece, estudou em Oxford o que um pretendido instrutor já deveria, creio, trazer sabido.
– Credes, porém, nele?
– A palavra crença está apagada faz muito tempo de meu dicionário teosófico. Eu sei, ou ignoro. O messianismo tem sido sempre um achaque dos débeis, que esperam de um enviado a redenção que só advir-lhes-há de si mesmos. Prometeu encadeado espera Epimeteu libertador, na tragédia de Ésquilo. Os hebreus esperam um rei. A idade média (veja-se a “História de Espanha”, de Moreno Espinosa, reinado de Fernando IV), também esperou pelo Cristo, e o Cristo que veio foi a Renascença, na qual arte e ciência se emanciparam do julgo religioso que as oprimia.
– Então Krishna, Budha, Jesus…
– Foram seres superiores que nos deram doutrinas eficazes para que nós, com o nosso esforço, nos redimíssemos. Nenhum deles fundou a religião confessional que se lhes atribui. Quem logo fundou-a foi o imperialismo de seus pretensos discípulos, os quais, escravos do inerte dogma que criavam, esqueceram que “religião” não é “crença”, senão dupla “ligadura” de fraternidade entre os homens, conforme sua etimologia latina.
– Imperialismo então?
– Sim, Imperialismo psíquico, sucessor fatal de todo imperialismo físico. Ao império romano sucedeu o império psíquico papal, ao império físico espanhol, o império psíquico jesuíta. Em Mahoma os dois imperialismos se apresentaram juntos.
– E ao império físico inglês quer seguir, pois, o império psíquico da Igreja holandesa ou católico-liberal, por Besant protegido?
– É muito possível.
– Que pensais, pois, da religião mundial, da que hoje se quer que faça parte da Sociedade Teosófica?
– Nunca estive de acordo com a Senhora Besant neste verdadeiro golpe de estado desferido ao clássico e crítico pensamento da Sociedade Teosófica, cujo objeto, afora o da fraternidade universal, é o do estudo comparado de religiões, ciências e filosofias, não a crença e menos a prática de religião alguma. O naturalista que disseca uma lagartixa, o faz sem adorá-la.
– Foi livre-pensadora a Senhora Blavatsky, fundadora da Sociedade Teosófica?
– No mais alto grau. Princesa russa, lutou ao lado de Garibaldi em Mentana contra o poder papal; considerou as religiões como “róseos contos infantis e objetos logo de exploração e domínio”, e as suas “revelações” como “duplos véus” lançados sobre a sabedoria iniciática das idades, que foi antes de tudo, ciência: uma ciência perdida, que é mister descobrir. “Teosofia” não significa “ciência de Deus”, se não dos super-homens ou “Deuses” dos gregos, os “homens representativos, grandes almas”, “mahatmas ou gênios”. Seu livro “Ísis sem véu” nega toda magia “que excede do poder e da compreensão do homem, e sua Doutrina Secreta” termina proclamando “a religião única da natureza, da qual todas deduziram seus dogmas até materializá-los em sua eterna poesia”. Moisés e Mahoma, ao proibir a carne de porco em nome da religião, não faziam senão ciência velada.
– Não é, pois, de agora o nome de teosofia?
– De modo algum. Teósofo ou “neoplatônico”, “eclético” e “harmonistas” foram chamados os filósofos alexandrinos, que com Amônio Sacas, quiseram deduzir da “gnose” o estudo comparado das religiões, normas científicas da conduta. Teósofos, chama César Cantú a Paracelso, Agrippa, Van Helmont, etc., o sofista do século XIII ao arabiano Asín Palacios…
– Então o futuro da Sociedade Teosófica?
– O vejo muito obscuro. Os livres-pensadores de Blavatsky caminharemos por um lado, e os devocionais de Besant, por outro. Livre-pensador em todos os meus livros, se prosseguem assim as coisas, deixarei definitivamente de ser membro da Sociedade Teosófica, sem por isto deixar de ser teósofo, como já tem acontecido a tantos conhecidos homens de ciência em todos os países…
Saímos da casa do homem honrado que tem sacrificado sua vida e seu nome pela Teosofia, convencidos como ele da grandeza do inviolável lema do Maharajah de Benares, esquecido entretanto por tristes messianismos, de que “não há religião superior à Verdade.
“Satiat nasti paro dharma”, como dizem os hindus.
(a) X.Y.Z
Trad. do espanhol.